Pode a palavra de ordem “Liberdade de Associação” servir de base para o movimento operário hoje?

Por Vladímir Ilitch Lênin, via marxists.org, traduzido por Pedro Furtado e revisado por Gabriel Landi

Na imprensa legal os liquidacionistas, encabeçados por Trótski, defendem que sim. Eles estão fazendo tudo em seu alcance para distorcer o verdadeiro caráter do movimento operário. Mas esses esforços são em vão. Os liquidacionistas que se afogam agarram-se ao que podem para salvar sua causa errônea.

Em 1910, pequenos grupos de intelectuais iniciaram uma campanha de petições pela liberdade de associação. Foi uma campanha fictícia. A massa dos operários permaneceu indiferente. Não se pode inflamar o proletariado com um empreendimento tão fútil. Era próprio de liberais acreditar em reformas políticas sob a autocracia czarista. Os operários perceberam de imediato a falsidade da empreitada e permaneceram indiferentes.

Os operários não são contrários a luta por reformas – eles lutaram pela Lei da Seguridade [1]. Através de seus deputados eles utilizaram todas as oportunidades dentro da Terceira Duma para conquistar pelo menos pequenas melhoras. Entretanto, a questão se trata de que a Terceira Duma e a Lei da Seguridade não são ficcionais, mas sim fatos políticos, enquanto “liberdade de associação” sob a monarquia de 3 de junho dos Romanov é uma promessa vazia dos liberais apodrecidos.

Os liberais são inimigos da revolução. Mesmo agora, eles são abertamente contrários a ela, a Terceira Duma das Centenas Negras [2] não os ensinou a perder o medo da revolução. Com medo da revolução, os liberais confortam-se com a esperança de reformas constitucionais e pregam aos operários uma dessas reformas, a liberdade de associação.

Mas os operários não acreditam na fábula a respeito de uma “constituição” sob as condições da Terceira Duma: com a falta geral de direitos e a tirania desenfreada. Os operários exigem seriamente a liberdade de associação e, portanto, lutam pela liberdade para todo o povo, pela derrubada da monarquia, por uma república.

As greves em abril e maio mostraram de fato que o proletariado havia se levantado em uma greve revolucionária. A combinação da greve econômica e política, reuniões revolucionárias e a palavra de ordem da república apresentada pelos operários de São Petersburgo no primeiro de maio são provas conclusivas do início do levante revolucionário.

A situação factual e objetiva da Rússia é esta: o proletariado inicia a luta revolucionária de massas para derrubar a monarquia czarista e a inquietação dentro das forças armadas cresce, um indicador de sua adesão à luta. Quanto aos camponeses democratas, os melhores dentre eles estão se distanciando dos liberais para aproximarem-se da vanguarda operária.

Enquanto isso, os liberais, inimigos da revolução, defendem apenas o caminho “constitucional” e promovem, contra a revolução, a promessa (vazia e fictícia) da “liberdade de associação” sob a monarquia czarista russa!

Essa é a real situação política. E estas são as verdadeiras forças sociais: (1) a monarquia czarista, que despreza toda “constituição”; (2) a burguesia liberal-monarquista, a qual, devido ao medo da revolução, finge que acredita na combinação entre a “liberdade” e o regime czarista; e (3) os democratas revolucionários, dentre os quais já se ergueu um líder, a massa operária, a cujo apelo os marinheiros e soldados de Helsingfors a Tashkent estão respondendo.

O quão estupido é, sob as circunstâncias, o apelo dos liquidacionistas à “liberdade de associação”! De todas as “reformas”, esses sábios da política operária liberal escolheram uma reforma constitucional impossível, que não é nada a além de uma promessa, e se divertem brincando de constitucionalismo europeu.

Não dará certo! Os operários estão deixando de lado os liberais e a política operária liberal. Eles apoiarão, desenvolverão e farão objeto de suas campanhas qualquer reforma que realmente se torna um problema imediato – tanto na Terceira Duma, quanto na Quarta Duma -, desde a seguridade até o aumento de salários para aqueles que trabalham como escravos nas oficinas.

Mas os operários riem com desprezo das promessas vazias e absurdas de uma reforma política constitucional sob a autocracia. Que a luta revolucionária começada pelas massas para derrubar a monarquia e instaurar a república cresça em escala e intensidade! A luta mostrará no que reformas tímidas resultarão caso a nova revolução seja derrotada – mas sugerir às massas um caminho não-revolucionário, uma reforma constitucional pacífica, agora, no início de uma ofensiva revolucionária, é algo que somente “homens no estojo” [3] pode fazer.

A ofensiva revolucionária que começou clama por palavras de ordem revolucionárias. Abaixo a monarquia! Viva a república democrática, a jornada de trabalho de oito horas, o confisco de todos as terras senhoriais!

Notas:

[1] N.E. Referência à legislação análoga àquela que hoje chamamos previdenciária ou securitária – ou seja, a luta pelo direito às licenças acidentárias, aposentadorias etc.

[2] N.E. A organização paramilitar reacionária Чёрная сотня (por vezes traduzido como “Cem Negros” ou “Centúrias Negras”) defendia o czarismo e estava na linha de frente dos ataques aos judeus (os chamados pogrons). Associados ao Partido Outubrista, que detinha a maioria na III Duma.

[3] N.T. “O homem estojo” é o protagonista de um conto homônimo do escritor russo A. P. Tchekhov, caracterizado como um homem de mente estreita, que teme toda iniciativa e tudo o que é novo.

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