Kemal Okuyan: “Quem vai parar a OTAN?”

Por Kemal Okuyan, via In Defense of Communism, traduzido por Konrado Leite

O seguinte artigo foi publicado no início deste mês, em plena guerra na Ucrânia, por Kemal Okuyan, secretário-geral do CC do Partido Comunista da Turquia (TKP):

“A OTAN não é uma organização, uma força ou um sistema de aliança que pode ser derrotado militarmente.” Temos afirmado isso desde que os exércitos russos entraram na Ucrânia.

O mergulho do mundo em uma escuridão cada vez maior e o fato de que o movimento internacional da classe trabalhadora há muito tempo está em refluxo, sem dúvida, leva as pessoas ao desespero e à tendência de cair no primeiro “remédio” que encontrarem.

No entanto, render sociedades às motivações primitivas como defesa ou sobrevivência muitas vezes leva a grandes desastres.

Hoje a humanidade está dividida entre aqueles que esperam que a “OTAN civilizada” entregue uma salvação à “barbárie russa” e aqueles que esperam que a Rússia, sob a liderança do bravo e inteligente Putin, acabe com a agressão dos EUA e OTAN, e isso é um problema maior do que se imagina.

Essa divisão se espalha quase igualmente entre todas as camadas do povo em todos os continentes, ou seja, os trabalhadores e os pobres estão apegados a receitas de salvação que nada têm em comum com seus interesses.

Uma oposição abstrata à guerra nunca impediu as guerras, mas temos que dizer que a divisão que apontamos está abrindo caminho para a guerra, até para uma ampla guerra imperialista, ou dando nome aos bois, uma nova guerra mundial.

Alguns dos que saíram às ruas dizendo “não à guerra” hoje exigem que a OTAN tome medidas mais efetivas contra a Rússia. No entanto, os países imperialistas ocidentais já estão a um passo de um enorme esforço militar.

Aqueles que têm assistido aos acontecimentos dos últimos dias se desenrolarem com os óculos entorpecentes da “divisão” que mencionei anteriormente podem não estar cientes disso, mas a OTAN está organizando um ataque incrivelmente intenso, talvez com uma superioridade psicológica que [ela] nunca teve desde a sua criação.

O militarismo alemão, que até certo ponto havia sido controlado pela União Soviética e que começou a se recuperar rapidamente com o colapso da URSS, abandonou completamente sua meticulosa e “covarde” maneira de agir que mantinha a décadas. Muitas empresas norte-americanas, que engordaram no clima de guerra, começaram a semana com gritos de alegria. A classe dominante polonesa, impulsionada por uma determinação histórica de servir à OTAN, ganhou mais na semana passada do que nos últimos 30 anos. Mesmo a administração ucraniana sob o controle de uma gangue fascista vê em si o direito de agir como representante dos oprimidos.

O “Projeto Europeu”, que havia perdido credibilidade aos olhos das grandes massas devido à crise econômica, ao terrível manejo da pandemia de corona nas mãos de políticos incapazes, de repente recuperou credibilidade.

.A Europa é a terra das lutas de classes; os equilíbrios ideológicos e políticos do mundo são determinados lá. Apontar a importância dessa geografia, onde eclodiram as duas guerras mundiais, não significa render-se a um ponto de vista eurocêntrico. Pelo contrário, indica a necessidade de um período de lutas que mudará radicalmente o atual status quo na Europa. Nosso lado nesta luta são os trabalhadores do continente.

As massas trabalhadoras na Europa, incluindo a Turquia, têm a obrigação de travar uma luta mais efetiva contra a agressão da OTAN, que está se tornando mais intensa.

Essa obrigação não pode ser cumprida, como alguns pensam, tomando um dos lados dessa “divisão”. A agressão da OTAN também não pode ser repelida se atribuindo um intelecto e profundidade especiais à liderança de Putin, que está procurando maneiras de defender os interesses da Rússia capitalista. De qualquer forma, em nenhum momento da ordem mundial de hoje o pensamento racional pode prevalecer. Assim como avaliar o imperialismo dos EUA olhando para a imagem patética de Biden significa avaliar apenas uma parte da realidade, atribuir grandes significados à imagem de líder forte de Putin nos levaria igualmente ao caminho de erros graves.

Hoje, os povos do mundo não podem ter um papel “ativo” na polarização OTAN versus Rússia. É claro que é absurdo igualar os lados nesse confronto; apesar de todas as suas contradições internas, os EUA, a OTAN e o bloco da União Europeia são a principal ameaça à humanidade. Mas o ponto criticamente importante é que quase toda a Europa, incluindo a Turquia, está sob o jugo de uma dominação de classe pró-OTAN.

É necessário determinar prioridades com base nas condições de cada país. Ao contrário das alegações dos partidários da OTAN que agora começaram a fazer muito barulho na Turquia, é o imperialismo dos EUA e a OTAN que ameaçam nosso povo.

Contra a agressão da OTAN, que se tornará mais crítica na política interna e externa da Turquia com os as mais novas movimentações, a única luta efetiva e legítima é aquela que é travada sobre uma base classista.

Seria uma derrota histórica para os trabalhadores do mundo alinhar-se a favor de uma luta pela hegemonia, que é obscurecida pelo chauvinismo das grandes potências, pelo militarismo, pela mentira, pela ocupação e que divide os capitalistas em poderosos e esmagados.

Os comunistas vêm de uma tradição que se opõe a conflitos com base em raças e em nações, e que defende conflitos baseados em classes. Esta tradição até agora usou a verdade, o senso de justiça e a retidão como suas armas mais importantes; ela adotou a soberania e a independência dos países e a oposição à mudança de fronteiras pela força bruta como os princípios mais importantes da luta contra o imperialismo.

Hoje, diante da crescente agressão da OTAN, somente agindo nesta base podemos fazer com que as massas apoiem a exigência pela saída imediata da Turquia da OTAN.

O imperialismo dos EUA e a OTAN não podem ser derrotados por um confronto em que os povos são oprimidos enquanto se enfileiram atrás de sua própria classe dominante, ou onde profundas desigualdades sociais em países individuais são perdidas na linguagem primitiva da geoestratégia.

Não esqueçamos que o governo Yanukovych, que foi derrubado pelo movimento Euromaidan de 2014 e fugiu para a Rússia após a última “revolução colorida” que tornou a Ucrânia uma militante fanática do imperialismo norte-americano e da OTAN, [aquele governo] empobreceu o povo com suas políticas, com suas estruturas podres tão mergulhada na corrupção, merecia ser derrubada há muito tempo não pelos neonazistas ou fascistas pró-Europa, mas por um movimento revolucionário da classe trabalhadora.

As sinistras “revoluções coloridas” que moldaram a Ucrânia com dez anos de diferença são o resultado da divisão das pessoas com base em serem pró-Rússia ou pró-Ocidente. Dentro da Ucrânia e da Rússia, porém, a população é dividida em exploradores e explorados, assim como nos Estados Unidos, Polônia, Turquia e outros lugares.

O momento é o de impulsionar o poder organizado dos trabalhadores contra a OTAN e os membros da OTAN. Esta é a única força contra a qual as armas mais avançadas, incluindo as nucleares, serão inúteis.

Não há diferença entre esperar ajuda da luta pela hegemonia no mundo capitalista e colocar esperança nos 6 partidos que se uniram contra o governo do AKP.

Ambos são projetos de destruição para o povo. Enquanto ainda há tempo, o povo deve se levantar para o surgimento de uma luta popular organizada.

tkp.org.tr

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