Ciência como produção: Althusser sobre as práticas científicas e sua articulação com o todo social

Por Pedro H. J. Nardelli

Apesar de sua importância indiscutível, as contribuições de Althusser vão (muito) além de tais textos, incluindo desde uma releitura inovadora de autores como Espinosa, Maquiavel e Rousseau até a proposta de um novo materialismo: o Materialismo Aleatório. Nos estudos da obra althusseriana, existem autores que defendem a existência de uma virada ou ruptura na produção de Althusser, considerando diversas fases e temáticas, a fim de favorecer um determinado Althusser em relação aos outros. Outros leitores defendem uma posição em que há uma continuidade em sua obra.


Louis Althusser é um conhecido filósofo franco-argelino nascido na Argélia em 1918 e falecido na França em 1990, cuja produção teórica vem influenciando os estudos sobre marxismo desde os anos 60[1]. Seus trabalhos mais conhecidos são os seguintes[2].

  • A favor de Marx (1965) que é uma coletânea de ensaios em que Althusser defende teses sobre a diferença teórica entre o Marx da juventude e o Marx maduro.
  • Para ler o Capital (1965) que contém textos relacionados às contribuições de Althusser e um grupo de estudantes apresentados em um seminário na Escola Normal Superior (ENS) em Paris. Em especial, Althusser faz uma leitura inovadora do texto de Marx com o objetivo de “produzir” explicitamente uma filosofia adequada à nova ciência histórica iniciada por Marx em O Capital.
  • Ideologia e aparelhos ideológicos de Estado (Notas para uma investigação) (1969) que é um ensaio onde Althusser apresenta a seus leitores como a ideologia existe materialmente em instituições que afetam concretamente os indivíduos, “sujeitando-os” desde sempre às suas interpelações.

Apesar de sua importância indiscutível, as contribuições de Althusser vão (muito) além de tais textos, incluindo desde uma releitura inovadora de autores como Espinosa, Maquiavel e Rousseau até a proposta de um novo materialismo: o Materialismo Aleatório[3]. Nos estudos da obra althusseriana, existem autores que defendem a existência de uma virada ou ruptura na produção de Althusser, considerando diversas fases e temáticas, a fim de favorecer um determinado Althusser em relação aos outros. Outros leitores defendem uma posição em que há uma continuidade em sua obra.

Minha tese é que ambas as leituras são corretas, dependendo do enfoque específico a ser dado[4]. Por exemplo, a maioria dos textos (ensaios) publicados dos anos 60 e 70 são explicitamente intervenções filosóficas com objetivos políticos de interferir diretamente nas discussões sobre o rumo do Partido Comunista Francês (PCF) após a morte de Stalin. Nos anos 50 ou nos anos 80, esse não era o objetivo; assim como os textos sobre autores como Rousseau e Maquiavel, que tinham um outro foco, mais pedagógico (já que eram parte de cursos do ENS), ainda que não retirando seu valor filosófico e político.

Mas não é só isso, a obra de Althusser não é apenas composta por textos publicados durante a vida do autor. De fato, há muitos escritos que só apareceram postumamente após a abertura de seus arquivos pessoais. Tal trabalho (ainda em andamento) reforça a posição defendida aqui, que é apresentada abaixo através de duas teses.

  1. Há uma diferença de objetos e objetivos nos textos dependendo o que Althusser pretendia  alcançar teoricamente e praticamente através de uma determinada intervenção, sempre considerando quem seriam os leitores esperados pelo autor. Com isso, uma análise literal (digamos “idealista”, “positivista”) sem entrar na conjuntura e contexto que o texto foi escrito certamente leva à conclusão de que existem rupturas na obra de Althusser.
  2. Há uma linha mestra no pensamento filosófico de Althusser que permanece de certa forma latente nas intervenções políticas dos anos 60 e 70, mas que se desenvolve durante toda sua obra. O apogeu de tal filosofia é o final dos anos 70 e permanece durante os anos 80 (mesmo considerando sua difícil situação pessoal) com os seus escritos explícitos sobre filosofia e com a proposta do materialismo aleatório. Dado isso, uma leitura da obra completa de Althusser, considerando tais textos como a chave de leitura das intervenções teórico-políticas dos anos 60 e 70, indicam uma continuidade de sua obra[5].

É importante notar que a obra de Althusser é bastante heterogênea: existe uma série de textos de Althusser como cartas a pessoas específicas, textos descrevendo a conjuntura política para os partidos comunistas, seminários aos alunos da ENS, seminários para sociedades profissionais, intervenções internas no PCF, trabalhos sobre arte, entrevistas, livros engavetados, rascunhos e notas. Dado isso e sabendo-se das dificuldades da vida pessoal de Althusser, conclui-se que sua obra não pode ser lida de maneira “linear” e literal (positivista) sem se referir a conjuntura. É importante lembrar que Althusser vê a filosofia como um campo de batalha teórico onde o filósofo sempre toma uma posição e pode ter um objetivo explícito a ser alcançado (ou um fact to be accomplished, seguindo a leitura althusseriana de Maquiavel[6]). No caso de Althusser, esse objetivo existe e é político e revolucionário, contra a ordem vigente[7], e essa deve ser a forma de ler Althusser.

Mas, cuidado, tal defesa de uma posição revolucionária (proletária) na filosofia não é arbitrária; ela é materialista e, portanto, defensora (e não juíza) das diversas práticas científicas[8]. De maneira bastante esquemática, podemos dizer que Althusser entende que a posição política afeta (de forma complexa) a posição de diferentes filosofias no campo de guerra filosófico, associando posições materialistas com a revolução (contra a ordem vigente, e contra posições reacionárias espiritualistas) e idealistas com a defesa da ordem vigente ou com a defesa de posições reacionárias.

Uma posição idealista, quase sempre dominante, produz e articula categorias universais inevitavelmente distorcendo (explorando) os resultados das diversas ciências a partir de construções teóricas unificadoras que “justifiquem” a ordem dominante, ou que indiquem a necessidade de uma volta ao passado baseado em construções teológicas. Uma posição materialista defende a autonomia das práticas científicas, combatendo as distorções idealistas; as ciências anunciam fatos verdadeiros sobre objetos bem determinados sob condições históricas específicas. O filósofo materialista se baseia nisso para produzir e defender suas teses. Dessa forma, uma filosofia materialista bem como sua prática é constituída a partir de categorias que auxiliam a prática científica combatendo tendências idealistas (“espontâneas”). Mas não só isso, o filósofo materialista prática a não-filosofia[9]: ele “ouve” e submete a sua prática filosófica a factualidade definida pelas ciências, e não o oposto.

Apesar da tal temática ser fundamental em Althusser, há um risco dos leitores se perderem na complexidade já mencionada de sua obra, confundindo conceitos científicos e categorias filosóficas fundantes de seus textos com definições espontâneas ou idealistas. O objetivo deste texto é revisitar as posições de Althusser sobre as práticas científicas como parte do todo social articulado, entendendo as ciências como resultado de um processo de produção de conhecimentos[10]. Para tanto, devemos ir além dos jargões e entender as bases teóricas de Althusser.

2. Ciências, práticas científicas e o todo social

O todo social

Para Althusser, o todo social é um complexo articulado em dominância[11]. Em outras palavras, há diversas formas e práticas sociais que coexistem em determinado período histórico, mas com suas diferentes temporalidades. Tais formas e práticas são estruturadas em diferentes níveis via instituições formais e informais, ou apenas hábitos. As múltiplas determinações em cada instância possuem uma eficácia distinta em relação às “regiões” específicas do todo para uma dada conjuntura. Como tais determinações nunca aparecem puras na realidade das formações sociais específicas, ele propõe o nome sobredeterminação (mas também subdeterminação) para indicar a multiplicidade na composição bem como seus efeitos e sua eficácia em relação ao todo social e suas regiões específicas.

Seguindo a leitura de O Capital, Althusser defende que a ciência da história iniciada por Marx estuda as diferentes formações sociais já existentes através do conceito de modo de produção, definida como a unidade às forças produtivas e às relações de produção. Cada período histórico corresponde ao modo de produção dominante em tal época, colocando outros modos de produção em posição subordinada. Além disso, segundo Althusser, as relações de produção são prioritárias em relação às forças produtivas, que “apenas” impõem restrições para aquelas. Em outras palavras, as forças produtivas em um dado momento definem os limites e as formas que as relações de produção (ou seja, relações de exploração) podem tomar em formações sociais particulares. Com isso, o fundamental para a existência e a permanência de um modo de produção dominante é a reprodução das relações de produção que o definem como tal. Dessa forma, todas as formas sociais dependem necessariamente da organização imposta pelas relações de produção já que elas determinam diretamente ou indiretamente a vida de todos os indivíduos que compõem o todo social. Como essas relações são necessárias (porém não suficientes) para a existência do todo social articulado e como sua forma de existência específica é o que determina os diferentes modos de produção que definem os períodos históricos distintos, ela é então a determinação em última instância.

O modo de produção é então a base econômica que impõe os limites possíveis a um todo social específico cuja reprodução é relativamente estável. Se não há tal estabilidade relativa (isto é, a estruturação do todo social está se modificando) de tal sorte que o modo de produção dominante aparece em risco e sua reprodução já não ocorre suavemente, podemos dizer que o todo social está em um período de transição com suas estruturas se rearticulando. Tais movimentos podem ter causas distintas como gatilho, que por sua vez podem ser gerados por fatos “externos” da formação social como por exemplo um fenômeno natural como uma epidemia ou “internos” como uma crise econômica ou um golpe de estado[12]. No entanto, é de extrema importância notar que tal “causa” é apenas aparente (apenas um gatilho) dentro de uma conjuntura definida na qual o fator estrutural da mudança é o conflito entre as classes de exploradores e as classes de explorados; conflito que é estabelecido pelas relações de produção (ou seja, relações de exploração). Os pontos e os tipos de conflito acontecem de maneira sobredeterminada (i.e., podem aparecer, por exemplo, como conflitos religiosos, jurídicos, políticos e/ou militares). Apesar disso, conflitos que de fato afetam a estruturação de um dado modo de produção são inevitavelmente perpassados pelo conflito fundante entre exploradores e explorados. Com isso, é através (e somente através) da luta de classes que as relações de exploração podem se modificar e daí o modo de produção se pode reestruturar dado os limites impostos pelas forças produtivas, para finalmente um novo todo social se cristalizar (“dar liga”, ou “dar pega” ou taking hold) conformando uma nova estruturação e suas respectivas articulações. É isso que nos diz o conhecido lema: a luta de classes é o motor (ou melhor, a força motriz) da história (que tem seus períodos definidos pelos diferentes modos de produção dominantes).

Veja que o todo social estruturado em dominância é uma abstração (concreta) que é apenas acessível em seus efeitos factualmente verificáveis nas formações sociais que de fato existem ou já existiram[13]. Tal premissa é a base para se fazer “a análise concreta da situação concreta” tão cara a Lenin, Mao e Althusser, seguindo Marx. Essa é a fundamentação da ciência histórica de Marx defendida por Althusser: uma ciência que é resultado de uma prática social — a prática científica — que de fato existe como parte do todo social em um dado período histórico, não podendo ser vista de maneira isolada. As ciências são “produtos do seu tempo”, sendo afetadas por outras instâncias e determinações do todo social, mas também as afetando. Tudo de maneira complexa, muitas vezes indireta, e sobredeterminada. Mas, o que são as ciências e as práticas científicas?

Ciências e práticas científicas

Desde escritos dos anos 50[14], Althusser entende a importância das ciências, defendendo suas peculiaridades de maneira intransigente. É importante notar que, apesar de algumas variações e refinamentos, uma leitura cuidadosa da obra althusseriana demonstra que tal posição se mantém até os últimos textos dos anos 80.

Esquematicamente, Althusser define as ciências como resultado de práticas teóricas cujos produtos são discursos que enunciam conhecimentos verdadeiros sobre objetos bem definidos. Tal discurso teórico, como resultado de toda prática teórica, é construído através de abstrações e generalizações. As ciências então provêm conhecimentos verdadeiros, gerais, sobre objetos conceituais (abstratos, purificados) que são relacionados através de uma teoria sobre tais objetos[15]. Duas condições são necessárias para a ciência na visão de Althusser: objetividade da teoria em relação aos seus objetos e seu caráter aberto. Em outras palavras, as ciências são processos sem Sujeito e não há teleologia.

Apesar de não haver um Sujeito (categoria filosófica) dentro das ciências, as práticas científicas devem ser necessariamente conduzidas por seus agentes produtivos — os cientistas — da seguinte forma. Em um dado momento histórico, existe uma série de saberes (científicos ou não), fatos e outras abstrações advindas de outras práticas sociais (chamadas Generalidades I) que são a matéria prima do cientista. Tais Generalidades I são organizadas, reformuladas e reorganizadas seguindo construções teóricas e métodos experimentais existentes em uma dada época (Generalidades II) para produzir conhecimento objetivos e verdadeiros sobre objetos determinados (Generalidades III).

É de extrema importância ressaltar que a prática científica é teórica (geral, simbólica, abstrata), lidando com “generalidades” e não com objetos “reais” particulares. Na verdade, segundo Althusser, há um paralelismo entre o mundo real (concreto) e o mundo teórico (simbólico, do pensamento). As ciências existem no segundo mundo provendo conhecimento a objetos do primeiro, mas sem confundir um com o outro. Há o objeto real (o concreto-real segundo Marx). Nas ciências, tal objeto real é tomado como uma abstração (Generalidades I), para daí ser purificado, experimentado e articulado em uma teoria científica (Generalidades II) produzindo um conceito científico, o concreto-em-pensamento, que produz conhecimento sobre o objeto real sem o modificar (Generalidades III).

Esse paralelismo não exclui experimentos práticos (como os de física); muito pelo contrário, experimentos são “materializações” da teoria já que eles são construídos a partir de objetos teóricos “purificados”. No entanto, note que nem todos os elementos das teorias podem ser diretamente observáveis. Além disso, cada campo de conhecimento define através de suas práticas científicas específicas suas próprias normas e critérios para determinar quais são os conhecimentos válidos (em certa conformidade com as ideias de Karl Popper[16], mas com diferenças precisamente colocadas por Althusser e principalmente por Dominique Lecourt em sua crítica ao positivismo lógico), sempre lembrando a historicidade de tal processo. Nas ciências, então as verdades impõem a si mesmas, ou seja, são imanentes à prática científica em determinado momento histórico de cada ciência particular. Em outras palavras, o concreto-em-pensamento produzidos pela prática científica deve enunciar conhecimentos verdadeiros sobre todos os concretos-reais existentes (ou que potencialmente possam existir) a que ele se refere, sendo constantemente postos a teste pela própria prática científica através de novos experimentos, métodos e construções teóricas. Por exemplo, Marx produziu conhecimentos científicos em O Capital sobre o modo de produção capitalista (abstração, concreto-em-pensamento). Tal teoria provê conhecimento sobre casos particulares como o capitalismo no Brasil no ano de 2021, ou sobre o capitalismo francês de 1960. Esta é a análise concreta (científica) da situação concreta (particular). Cada caso é visto como uma realização da teoria, uma formação específica das formas sociais capitalistas. A análise de cada caso pode levar a produção de novos conhecimentos, a eliminação de antigos conceitos ou a sua retificação; novas determinações, ou novos invariantes podem ser encontrados, outros conhecimentos podem ser descartados, novas construções teóricas podem ser propostas e aceitas (ou não). Na visão de Althusser, as ciências são abertas.

Dessa forma, novos conceitos podem ser adicionados à teoria. Muitas vezes tais conceitos são necessários para dar consistência à estrutura do discurso teórico. No entanto, outras vezes novos conceitos exigem uma reformulação teórica e dessa forma o que pode ser chamado de “verdade” dentro de um campo do conhecimento é alterado. A história das ciências contém diversos exemplos sobre isso. Althusser, seguindo os ensinamentos de Gaston Bachelard, chama isso de ruptura epistemológica. Apesar de claras diferenças estabelecidas por Dominique Lecourt[17], tais mudanças estruturais dentro das formações teóricas apontam para o caráter social e aberto das práticas científicas em certa conformidade com o caráter sociológico das ciências defendido por Thomas Kuhn[18]. Ou seja, apesar das ciências serem discursos que produzem conhecimento verdadeiros (dado o período histórico) e objetivos, sua prática é social e, portanto, histórica. Então, tal prática está necessariamente articulada  ao (e então sobredeterminada pelo) todo social, afetando-o e ao mesmo tempo sendo afetada por ele.

Práticas científicas e suas articulações com todo social

As práticas sociais existem articuladas como partes constituintes do todo social, que por sua vez é articulado em dominância. As ciências, como discurso, provêm conhecimentos objetivos primeiramente sobre seus respectivos objetos abstratos, que apenas existem da teoria, para depois particularizar e, ainda dentro da teoria, especificar os objetos particulares dentro da classe de objetos gerais. Pode-se ler assim a ideia de ir “do abstrato para o concreto” dentro da teoria. As ciências dessa forma existem em paralelismo com a realidade concreta uma vez que as diferentes ciências produzem conhecimentos concretos, objetivos, sobre diferentes objetos que existem concretamente, porém sem afetá-los diretamente através da prática científica.

Aqui é importante ressaltar alguns pontos. As ciências (discurso objetivo sobre a realidade concreta que produz conhecimentos verdadeiros) e as práticas científicas devem ser diferenciadas. As ciências são produto das práticas científicas, que por sua vez não podem ser entendidas como parte do “mundo paralelo” que as diferentes ciências existem. As práticas científicas são primariamente articuladas com o todo social, sendo afetadas por ele, mas também o afetando. As práticas científicas são afetadas principalmente através de seus agentes de produção (os cientistas), dos conhecimentos, técnicas e abstrações gerados por outras práticas sociais, e do ambiente institucional em que tais práticas existem (por exemplo, universidades, e a comunidade acadêmica internacional). Elas afetam o todo social através do conhecimento produzido sobre a realidade concreta, servindo como base para práticas e inovações nas áreas políticas, médicas, legais, educacionais e tecnológicas.

Há uma óbvia tensão entre a “objetividade das ciências” e a “realidade social das práticas científicas”. Althusser identificou na filosofia espontânea dos cientistas[19] um dos pontos nodais de tal relação. De forma esquemática, podemos resumir o argumento da seguinte maneira. A filosofia pode ser vista como um campo de batalha entre posições materialistas e idealistas. Os cientistas atuando como agentes de práticas científicas são dominantemente materialistas. No entanto, a posição idealista é a dominante na grande maioria das outras práticas sociais. Mais que isso, uma das funções da prática filosófica (também teórica) é produzir esquemas universais que “expliquem” virtualmente tudo (incluindo o “nada”). Essa posição idealista na filosofia é geralmente defensora de uma ordem pré-estabelecida, também relacionada com a visão de mundo dos cientistas e com sua formação ideológica como “sujeito”. Com isso, o discurso produzido como produto das práticas científicas (ou seja, as ciências) apresentam inevitavelmente resquícios do idealismo dominante de outras práticas não científicas através da filosofia espontânea dos cientistas. Isso tendencialmente gera obstáculos para a produção de novos conhecimentos que tem o potencial de afetar a ordem estabelecida. Mas, mesmo que tais conhecimentos com potencial disruptivo sejam produzidos, a filosofia idealista se encarrega de se reestruturar, distorcer e incorporar (não sem “dor”) tais novidades para justificar a ordem existente. Com isso, Althusser nos diz que a filosofia idealista explora as ciências.

Tal fato, para Althusser, não é uma mera peculiaridade da prática filosófica. Tampouco isso advém de idiossincrasias de diferentes autores. A defesa da ordem está diretamente relacionada a posições políticas conservadoras. Muitos filósofos idealistas, objetivando justificar “as coisas como elas são” estão em última instância defendendo a classe dominante em detrimento das classes exploradas. As grandes filosofias idealistas racionalistas funcionam estruturalmente como “mapa teórico universal” em que virtualmente todas as práticas sociais são justificadas ou explicadas através de um sistema teórico-racional, em que tudo é garantido pela Razão (que é uma categoria filosófica). A filosofia se torna então um laboratório em que as diferentes ideologias existentes (isto é, concepções distorcidas ou falsas das relações que os indivíduos mantêm com as práticas sociais que os constituem como sujeitos) são articuladas em um discurso teórico através de argumentos consistentes, assegurados pela Razão (a Garantidora Universal da Ordem). Obviamente, como essa prática é parte do todo social, a causalidade aqui é complexa e geralmente indireta (ou seja, estrutural e sobredeterminada). Ainda assim, é importante indicar que uma posição idealista na filosofia é em última instância uma defesa da ordem através de um sistema teórico-racional e, então, está sempre relacionada a uma defesa das classes exploradoras.

Uma posição materialista, segundo Althusser, é diferente. Ela não oferece garantias enquanto provê um sistema teórico aberto. Uma posição materialista na filosofia respeita a autonomia das diferentes práticas sociais, “aprendendo” com sua materialidade ao invés de enquadrá-las dentro de sistemas filosóficos fechados. A intervenção da filosofia materialista é teórica e funciona “traçando linhas de demarcação” tentando diferenciar a realidade concreta (material) das práticas sociais e as ideologias constitutivas que “sujeitam” ideologicamente os indivíduos. O conhecimento da realidade concreta advém de práticas científicas. Por não estar subordinada a uma ordem pré-determinada através de “garantidores” como a Razão ou Deus, tal prática filosófica pode ser revolucionária já que “desnaturaliza” a ordem estabelecida. Uma vez que as ciências sociais demonstram que não há nenhuma justificativa transcendental na existência de classes sociais além da própria exploração econômica (material), uma posição materialista está relacionada (também de maneira complexa) ao apoio às classes exploradas na sua luta contra as classes exploradoras. Pode-se então dizer que uma posição materialista se baseia no lema “Ciência e Revolução” e, através dessa abordagem, Althusser argumenta que a filosofia é a luta de classes na teoria.

O problema do conhecimento e a filosofia das ciências

Até agora vimos então que: (i) as ciências são discursos objetivos sobre a realidade concreta que produzem conhecimento, (ii) as práticas científicas que produzem as ciências existem como parte do todo social articulado com outras práticas sociais, (iii) os cientistas (agentes das práticas científicas) fazem parte de outras práticas sociais, sujeitos então às suas respectivas ideologias, que são geralmente articuladas através de filosofias dominantemente idealistas, e (iv) posições idealistas são relacionadas às classes exploradoras, enquanto posições materialistas podem ser revolucionárias já que desnaturalizam a ordem estabelecida. Tais pontos indicam que apesar da prática científica ser materialista já que lida com conhecimentos objetivos sobre a realidade concreta, os cientistas são constituídos ideologicamente como sujeitos e tendem a “pensar” sua própria prática científica como parte de um sistema racional-universal (ou seja, idealista), tomando forma como a já mencionada filosofia espontânea dos cientistas.

Uma das consequências de tal tensão é a busca por garantias filosóficas em relação aos conhecimentos produzidos pelas ciências. Essa é a temática do “problema do conhecimento” em que filósofos argumentam como é possível conhecer e através disso determinam as condições necessárias universais para que conhecimentos possam ser chamados de científicos sem considerar as particularidades das diferentes ciências. Essa tendência universalizante indica que o “método científico” deve ser o mesmo para todos os campos do saber e seus respectivos objetos. Dessa forma, as bases lógicas universais do “método” devem servir para gerar conhecimentos sobre buracos negros, epidemias e sistemas econômicos.

Althusser compara sua posição materialista que diferencia o concreto-real e o concreto-em-pensamento com duas tradições filosóficas dominante em relação ao problema do conhecimento: o neopositivismo lógico e o empirismo[20]. De maneira bem resumida, o empirismo confunde o objeto do conhecimento com o objeto real. Com isso, a busca é pela essência dos objetos, indicando que o conhecimento é parte do objeto real e não algo produzido por agentes na prática científica. Dessa forma, para um empirista, a “verdade” do conhecimento científico faz parte do objeto e a função do cientista é descobrir tal verdade eterna e preexistente. Podemos nos referir a isso como “investigação científica” (o termo em inglês parece mais interessante scientific inquiry; talvez uma tradução melhor fosse “inquérito científico”).

O neopositivismo lógico prioriza a universalidade do método através da lógica matemática. Apesar de pontos positivos como considerar os fatos objetivos obtidos através das práticas científicas através de experimentação, Althusser nos indica sua principal limitação:

This means that all ‘objects’ that are not susceptible of verification by an experimental test that can be repeated at will anywhere at any time (since these conditions are objective, they can be reproduced) do not exist for science, and therefore do not exist at all, or exist in the form of unverifiable discourses that are imaginary, since they cannot be experimentally refuted. (p. 92, “Philosophy for Non-philosophers”) [Tradução do autor: Isso significa que todos ‘objetos’ que não são suscetíveis a verificação por um teste experimental que possa ser repetido à vontade em qualquer lugar em qualquer momento (uma vez que essas condições são objetivas, elas podem ser reproduzidas) não existem como ciência e, portanto, não existem de forma alguma, ou existem de uma forma de discursos não verificáveis que são imaginários, já que eles não podem ser experimentalmente refutados.]

Karl Popper é provavelmente o autor mais relevante dessa corrente (apesar de suas diferenças com o famoso Círculo de Viena) que serve como base da “filosofia da ciência contemporânea” e é ainda muito influente nas práticas científicas. Althusser, em 1986, escreve um pequeno texto sobre Popper[21] indicando pontos positivos e negativos de sua abordagem. Abaixo apresentaremos um trecho de tal análise.

That is why Popper, the darling of Western epistemology, is right and wrong at the same time.

He is right when he recognizes that the human sciences do not proceed from [ne relèvent pas de] laws the way physics does.

He is right to say that every verification must be falsifiable, although he has a Kantian idealist tendency to formulate the conditions of the falsifiability of a statement a priori.

But he is wrong about the following points.

  1. There can be no epistemology as a science of science (as a theory of theoretical practice) or science of the sciences.
  2. There exists only a history of the sciences and the epistemological ideology which they produce, under the domination of which that history is produced.
  3. That history, like any history, does not obey laws; we do, however, observe invariants in it (Lévi-Strauss) as well as their singular variations (Machiavelli, Spinoza, Freud).

The theory of psychoanalytical or historical invariants, like the theory of topographical figures of the singular unconscious, like the theory of individual and social history, can be, if it is taken seriously, a falsifiable scientific theory.

  1. Thus Popper is wrong to deny history, psychoanalysis and the theory of the class struggle all scientific value; he does so because he is obsessed by the model of Galilean physics. Yet Heidegger denounced, and rightly, the exploitation of Galilean science by modern technology. Derrida has done even better, producing a theory of aleatory-materialist writing in his theory of the trace and the margins. (p. 156-157 History and Imperialism: Writings, 1963-1986).

[Tradução do autor:]

É por isso que Popper, o queridinho da epistemologia ocidental, está certo e errado ao mesmo tempo.

Ele está certo ao reconhecer que as ciências humanas não procedem a partir de leis do mesmo modo das ciências físicas.

Ele está certo em dizer que toda verificação deve ser falseável, embora ele tenha uma tendência idealista kantiana para formular as condições de falseabilidade de uma afirmação a priori.

Mas ele está errado sobre os seguintes pontos.

  1. Não pode haver epistemologia como ciência da ciência (como teoria da prática teórica) ou como ciência das ciências.
  2. Há somente uma história das ciências e da ideologia epistemológica que elas produzem, sob o domínio da qual essa história é produzida.
  3. Essa história, como qualquer história, não obedece a leis; no entanto, observamos nela invariantes (Lévi-Strauss), bem como suas variações singulares (Machiavelli, Spinoza, Freud).

A teoria dos invariantes psicanalíticos ou históricos, como a teoria das figuras topográficas do inconsciente singular, como a teoria da história individual e social, pode ser, se levada a sério, uma teoria científica falseável.

  1. Assim, Popper está errado ao negar à história, à psicanálise e à teoria da luta de classes todo valor científico; ele o faz porque é obcecado pelo modelo da física galileana. Ainda assim, Heidegger denunciou, e com razão, a exploração da ciência galileana pela tecnologia moderna. Derrida fez ainda melhor, produzindo uma teoria da escrita materialista aleatória em sua teoria do traço e das margens.]

Esse texto datado de 1986 indica que Althusser mantém sua visão que as verdades científicas são diretamente relacionadas aos seus objetos específicos, considerando que existem ciências nas quais é impossível repetir experimentalmente situações particulares como, por exemplo, as ciências históricas ou a psicanálise. Em tais campos do conhecimento, existem invariantes e leis tendenciais (talvez o termo amplamente utilizado dentro do marxismo seja infeliz, podendo ser denominado diretamente tendências) dentro das variantes particulares realmente existentes. De fato, a ideia de leis universais é algo questionável até nas ciências físicas[22]. As verdades científicas sobre objetos determinados são objetivas, porém históricas, já que as práticas científicas em um dado período histórico não só dependem dos conhecimentos já estabelecidos dentro da teoria que define tal ciência, mas também dos modos existentes de experimentação e/ou verificação; como é comum dizer, não se pode acusar Newton por não ter sido Einstein.

De fato, uma característica positiva tanto de Popper quanto de Kuhn é a posição que as ciências são abertas e sem fim (o adjetivo em inglês open-ended parece capturar melhor essa ideia) de tal sorte que nada garante que a verdade científica de hoje será a mesma de amanhã. Tal caráter histórico e social das ciências é atualmente aceito por várias vertentes de cientistas e filósofos[23], mas certamente essa historicidade se apresenta em formas bastante distintas dentro de posições idealistas e materialistas. De maneira esquemática, podemos dizer que uma posição idealista tem como possíveis lemas: (i) “inquirir o objeto” para encontrar sua essência, ou (ii) “deduzir a realidade concreta” através de abstrações lógico-matemáticas. Uma posição materialista visa “apreender a realidade concreta” através de construções teóricas que geram conhecimentos sobre objetos “purificados” via abstrações. Em algumas ciências experimentais como a física ou química, é possível “materializar” a teoria para a testar[24] seguindo a lógica de Popper. Em matemática pura, a realidade “concreta” pode ser entendida pelos axiomas e pelas operações válidas que determinam a “verdade” das deduções que produzem o conhecimento matemático. Nas ciências históricas, há invariantes dentro de particulares de tal sorte que se deve entender as formas sociais e suas relações estruturais para se produzir conhecimento sobre as formações particulares que materialmente existem. Essa posição materialista defende que há determinações na realidade concreta, mas não há determinismo,[25] (determinismo tal qual expresso pelo chamando “Demônio de Laplace”).

Ciências, práticas científicas e classes sociais

Althusser nos mostra como as práticas científicas concretas estão articuladas de forma complexa com o todo social histórico através da filosofia vista como um campo de batalha entre tendências materialistas e idealistas, relacionadas em última instância a posições de classe e então a posições políticas. Essa articulação se dá através da filosofia espontânea dos cientistas (que são os agentes de produção das ciências). Não apenas isso, as práticas científicas geralmente existem dentro de instituições formalmente estabelecidas como universidades e centros de pesquisa e então elas dependem inevitavelmente de determinações econômicas. Pode-se dizer que as formas estruturantes do modo de produção restringem as práticas científicas, apontando quais são as ciências possíveis e desejáveis que potencialmente irão facilitar a reprodução social, ou no pior dos casos não interferir nela. Com isso, as práticas científicas que indiquem futuras aplicações benéficas ao modo de produção dominante tendem a ser privilegiadas e então favorecer as classes dominantes[26].

Em suma, as práticas científicas só podem ser entendidas como parte da estrutura complexa do todo social e então sendo perpassadas pelas contradições, lutas e crises inerentes ao modo de produção dominante. No mundo contemporâneo em que o modo de produção dominante é o capitalismo, as práticas científicas são estruturalmente capitalistas em sua forma, mesmo que as ciências produzidas como produto de tais práticas sejam objetivas, ou seja, não relacionadas a nenhuma classe social[27].

3. Práticas científicas contemporâneas, tecnologia e capitalismo

Marx em O Capital produziu os conhecimentos científicos de seu objeto de estudo: o modo de produção capitalista. De maneira rudimentar, podemos indicar as características necessárias para tal modo de produção:

  • a forma-mercadoria é dominante,
  • a exploração fundante é entre os proprietários dos meios de produção (exploradores) e os trabalhadores que não os possuem (explorados),
  • acumulação de capital é necessária para seu crescimento permanente, e
  • o Estado é uma forma social que é um terceiro necessário para garantir a produção de mercadorias e a reprodução das relações de produção (isto é, relações de exploração) permitindo a acumulação e o crescimento do capital.

Althusser nos apresenta em Sobre a reprodução  e em outros escritos como se dá a reprodução de tais relações de exploração e Mascaro em Estado e forma política nos detalha como o Estado contemporâneo e o direito são capitalistas em suas formas, sendo eles derivados factualmente da forma-mercadoria[28]. As práticas científicas contemporâneas são organizadas via de regra em instituições reconhecidas legalmente pelo Estado como centros de pesquisa e universidades e, portanto, são estruturalmente capitalistas participando então dos mecanismos de reprodução social[29].

É importante ressaltar que, assim como todas as práticas e formas sociais que constituem o todo social articulado capitalista, as práticas científicas são sobredeterminadas e transpassadas pela luta de classes capitalistas[30]. Em sua materialidade, as práticas científicas que tendencialmente recebem e receberão financiamento para a “produção de suas ciências” são aquelas cujos conhecimentos produzidos têm papel direto ou indireto na reprodução social capitalista. Da termodinâmica à física quântica, da virologia à teoria da informação, sempre há uma determinação econômica na produção dos conhecimentos objetivos. Note bem: o argumento diz que há uma determinação econômica nas ciências e não que os conhecimentos científicos são determinados somente pela economia.

Aqui é importante ressaltar uma diferenciação utilizada por Althusser: ciência não é somente técnica nem tecnologia[31]. As práticas técnicas e a técnica em si têm um caráter de aplicação e de um saber de “como fazer” (know-how). Pode-se dizer assim que as ciências não têm objetivos externos e seu objetivo único é produzir conhecimento não-subjetivo de seu respectivo objeto, enquanto as técnicas têm objetivos definidos pela aplicação[32]. Importante dizer que as técnicas não dependem necessariamente das ciências. No entanto, as técnicas podem se beneficiar (e de fato se beneficiam) daquelas. A tecnologia e as diferentes práticas tecnológicas devem ser entendidas nesse contexto como aplicações dos conhecimentos científicos para desenvolver novas técnicas e retificar ou melhorar técnicas já existentes.

É interessante entender como o desenvolvimento de novas técnicas para produção industrial, visando em última instância aumentar o mais-valor relativo, é relacionado com o desenvolvimento das ciências produzidas em um dado período histórico[33]. Por exemplo, o estudo sobre motores a vapor na Inglaterra e Escócia durante o período da revolução industrial produziu não somente tecnologia (motores com maior eficiência energética) mas também foram fundamentais para estabelecer um novo campo nas ciências físicas: a termodinâmica[34]. Mas, para além das ciências físicas, novas ciências se abriram, e continuam se abrindo, em momentos de ruptura epistemológica devido às novas técnicas e tecnologias. Por exemplo, há teorias científicas que determinam os limites fundamentais de processamento e transmissão de dados por computadores e redes de comunicação. Kolmogorov, Shannon e Turing são os grandes nomes do information age[35].

Note que tanto motores quanto computadores e sistemas de telecomunicações já eram produzidos como aplicação dos conhecimentos das ciências físicas antes do estabelecimento da termodinâmica, das ciências da computação e da teoria da informação. O aperfeiçoamento técnico ia se dando heurísticamente através de investimentos públicos e privados para o desenvolvimento das assim chamadas “ciências aplicadas” (aplicação de conhecimentos científico para melhoria de técnicas). Em momentos de ruptura epistemológica, o desenvolvimento de novas tecnologias criou as condições necessárias para a emergência de uma nova ciência que produz conhecimentos abstratos gerais sobre tais objetos técnicos, potencialmente determinando seus limites fundamentais.

Tal dinâmica nunca é isolada do todo social. Competição entre capitalistas, investimento público em tecnologias militares devido a questões geopolíticas, planos nacionais de desenvolvimento, tudo isso interfere diretamente ou indiretamente nas práticas científicas[36]. Kolmogorov era um grande nome das ciências matemáticas na União Soviética. Shannon trabalhava no renomado centro de pesquisa de telecomunicações Bell Labs. Turing, apesar de sua vida pessoal trágica, foi um dos principais cientistas britânicos responsáveis por decodificar o código utilizado pelos alemães durante a Segunda Guerra. Obviamente, poderíamos dar outros exemplos no campo da biologia, medicina, química, economia e psicologia. Nosso objetivo, no entanto, é ilustrar que as práticas científicas de fato produzem conhecimentos objetivos, mas os conflitos e convergências dentro da dinâmica do todo social sobredeterminam quais os conhecimentos científicos que de fato são produzidos.

Resumidamente, as ciências advêm de processos sem fim ou finalidade; os financiadores das práticas científicas têm objetivos e querem conhecimentos que possam impactar de maneira positiva a reprodução social geral ou a sua posição individual dentro da exploração capitalista. Apesar das formações sociais específicas apresentarem diferentes visões sobre o desenvolvimento científico e tecnológico, é importante ressaltar que, no modo de produção capitalista, as práticas científicas são necessariamente sobredeterminadas pelos seus conflitos internos e posições de classe. Dessa forma, as ciências, que são definidas como discursos objetivos sobre objetos determinados, são de fato neutras; mas as práticas científicas que produzem as ciências não são neutras, mas sim estruturalmente capitalistas já que existem em instituições cujas formas são derivadas factualmente de formas capitalistas. Propriedade intelectual, ciência com impacto, ciências abertas, startups, inovação e plataformas são as palavras-chaves de hoje no regime de acumulação pós-fordista[37]. O Realismo Capitalista é norma nos centros de pesquisa e universidades[38]. Ainda assim, há possibilidades de abertura para a luta através de atividades desenvolvidas nas margens e, nesse ponto, a leitura materialista-aleatória de Althusser em conjunto com a ciência da história iniciada por Marx é fundamental para apontar a possibilidade de mudanças estruturais no todo social.

4. Althusser: Ciência e revolução

Para Althusser, marxismo é ciência e revolução[39]. Em um texto bastante revelador chamado How Can Something Substantial Change?[40], nos é apresentado com bastante clareza os impasses vividos por Althusser como membro ativo do PCF, revelando-nos a sua “solidão” (a mesma solidão de Maquiavel dentro da conjuntura italiana do século dezesseis). Mais importante que o conteúdo em si, tal texto demonstra como Althusser analisa cientificamente a conjuntura através de uma lógica materialista-aleatória em que há determinações, mas não há nem determinismo nem indeterminismo.  Diz-nos:

The question becomes: Can something substantial be changed in the Party from inside the Party?

(…)

This is, obviously, a question of judgement, but I do not believe in a possibility of this sort under present circumstances. It is enough to see how the Party succeeded in ‘digesting’ the May events, integrating them into its traditional line – to observe how, in particular, it succeeded in treating the student movement – in order to understand that it is quite capable of absorbing the shock of even a very big mass movement and maintaining leadership of it.

(…)

How will it ever be possible for a change to come about?

(…) The Party will not be changed from outside; it can only be changed from inside. At the same time, however, we just saw that it was not possible to change its inside [son dedans]. … Is there no way out, then?

There remains one way out. It is that the Party is affected (changed) in its inside by an outside event, but an event such that it affects it in its inside, in its substance, political line and political references.

(…)

One cannot, setting out from there, play the prophet. One can, however, imagine that the masses outside the Party will have their say over a shorter or longer period, including some of the elements organized in oppositional groups. The big question then will be whether the way out of the crisis thus initiated leads left or right. It is likely that Party unity would not survive such a crisis and that the right and the left would regroup in opposed organizations. (“History and Imperialism: Writings, 1963-1986”, p.37-39; marcas em negrito por mim)

[Tradução do autor:

A questão é: pode algo substancial ser mudado no Partido a partir de dentro do Partido?

(…)

Obviamente, trata-se de uma questão de julgamento, mas não acredito em uma possibilidade desse tipo nas atuais circunstâncias. Basta ver como o Partido conseguiu ‘digerir’ os acontecimentos de maio, integrando-os na sua linha tradicional – observar como, em particular, conseguiu tratar o movimento estudantil – para compreender que é bastante capaz de absorver o choque de até mesmo um imenso movimento de massa e a manter a sua liderança.

(…)

Como será possível que ocorra uma mudança?

O Partido não será alterado de fora; só pode ser alterado por dentro. Ao mesmo tempo, porém, acabamos de ver que não era possível alterar o seu interior [son dedans]. … Não há saída, então?

Resta uma saída. É que o Partido é afetado (mudado) em seu interior por um acontecimento externo, mas acontecimento tal que o afeta em seu interior, em sua substância, linha política e referências políticas.

(…)

Não se pode, partindo daí, bancar o profeta. Pode-se, no entanto, imaginar que as massas fora do Partido terão uma palavra a dizer durante um período mais curto ou mais longo, incluindo alguns dos elementos organizados em grupos de oposição. A grande questão então será se a saída da crise assim iniciada levará à esquerda ou à direita. É provável que a unidade do Partido não sobrevivesse a tal crise e que a direita e a esquerda se reagrupem em organizações opostas. ]

Nesta pequena nota de três páginas escritas em abril de 1970, fica clara a posição de Althusser que: (i) a estrutura do PCF é coesa o suficiente para absorver demandas internas mas sem se modificar substancialmente (ou seja, sem mudar a estrutura em si) e então impossibilitando mudanças que advenham da eventos internos ao partido, e (ii) a mudança é possível mas através de um evento externo de grande relevância que afete a dinâmica interna do PCF, obrigando-o a alterar sua estrutura (tal evento pode ser a queda da União Soviética, ou uma guerra entre a União Soviética e os EUA). Mas, mesmo que haja alguma mudança estrutural, é impossível saber qual será o seu resultado olhando a partir do período que a antecede. Ainda assim, é possível analisar as determinações concretas da situação concreta e daí indicar possíveis mudanças para uma dada conjuntura e a conjunção de fatores que a sobredeterminam. Mais, é possível pensar e intervir dentro da conjuntura. Maquiavel, Marx, Lenin e Mao talvez sejam os maiores exemplos para Althusser: eles não só produzem ciência ao “pensar a situação concreta” através de determinações objetivas e suas diferentes efetividades, mas também utilizam o conhecimento científico para intervir e tentar produzir mudanças estruturais dentro do todo social, ou seja, agem ativamente para a revolução.

A leitura althusseriana sobre Maquiavel[41] e Rousseau[42] é bastante informativa. Em resumo, para Althusser, Maquiavel é o primeiro a pensar concretamente sobre a conjuntura particular através de determinações “gerais e objetivas” que poderiam permitir a unificação da Itália. Uma mistura de sorte com coragem de uma pessoa (o Príncipe) não definida em um lugar não definido dada uma conjuntura (interna e externa) favorável. Maquiavel indica as determinações e um guia de ação para o Príncipe desconhecido atingir o objetivo final, o fact to be accomplished, que é a unificação da Itália. Maquiavel pensa como um materialista já que ele entende a impossibilidade da conjuntura presente para se chegar a tal objetivo, que ainda assim é possível. Maquiavel pensa de maneira revolucionária, e não como filósofos idealistas que justificam o fato consumado (o accomplished fact) como inevitável. Em Rousseau, Althusser lê como as mudanças estruturais se dão através de fatos externos que alteram as dinâmicas internas do funcionamento do todo social, impondo novos arranjos estruturais que dão pega e se reproduzem.

O pensamento althusseriano é claro ao mostrar o poder de coerção das determinações econômicas dentro do todo social em que vivemos. Talvez com um argumento que beira o óbvio, no modo de produção capitalista, o capital (que é constituído pelas suas relações de produção) é a determinação em última instância; no dia em que o capital não for mais tal determinação, o todo social não será capitalista. Assim como o entendimento dos limites fundamentais das leis da termodinâmica ou da teoria da informação não leva a construção de motores ou sistemas de telecomunicações que atinjam sua eficiência máxima definidas pela teoria, o conhecimento científico da história e das determinações sociais não levam à revolução. As ciências físicas orientam os engenheiros e técnicos definindo o que é materialmente possível e indicando os caminhos para novos objetos técnicos, novas técnicas, e melhores equipamentos. Simondon apresenta isso de maneira bastante interessante em seu estudo sobre os modos de existência de objetos técnicos[43]. De maneira similar, os conhecimentos científicos de determinações biológicas objetivas indicam os caminhos possíveis para, por exemplo, a prática médica ou para a produção de novos fármacos e vacinas. Para Althusser, as ciências sociais podem ser vistas de maneira similar: elas devem produzir conhecimentos objetivos que orientem os revolucionários em seu objetivo que é acabar com a exploração de classes e então com o modo de produção capitalista, mas sem garantias.

Nesse contexto, podemos entender o que Althusser se propõe nos anos 60 e 70: lutar contra o idealismo de disciplinas que produzem “técnicas refinadas de controle social” e que assumem como “natural” o modo de produção capitalista ou formas sociais capitalistas. Para Althusser, as ciências sociais de maneira estrita não podem assumir como dado e eterno algo que é perene. O conhecimento muda e nunca é fechado; no entanto assumir como dado e eterno algo que é socialmente determinado é falso, apologético e ideológico. Marxistas, que são anti-capitalistas, não podem cair nessa falha e então não podem defender posições anti-científicas como as formuladas por posições humanistas e economicistas.  O importante é notar que Althusser não aceita como ciência o que tais posições chamam como tal.

Althusser produziu conhecimento científico e interveio dentro de sua conjuntura. Ele aplicou a fórmula da “luta de classes na teoria”, procurou aliados teóricos de Maquiavel a Marx, organizou seminários, entendeu o poder de suas formulações, pensou em extremos, abraçou o aleatório, reformulou suas posições e mudou o pensamento marxista defendendo a ciência e a revolução, equipado com as “armas da crítica”. Como argumentado no início, mais do que uma carreira acadêmica tradicional apresentando uma bibliografia “linear”, Althusser a meu ver publicava seus textos somente para intervir na conjuntura política sempre pensando como um materialista-aleatório, até em seus textos “clássicos”.

Uma leitura materialista-aleatória possível a partir de alguns escritos do próprio Althusser é que ele entrou mais ou menos sem querer no debate sobre o humanismo no marxismo. Tal encontro aleatório deu pega já que seu primeiro texto explicitamente anti-humanista nos anos 60 causou grande repercussão. A partir daí, Althusser entendeu a potência de tal intervenção e continuou a publicar textos relacionados a isso. Muitas vezes, tal tarefa de lutar contra posições dominantes necessitava “ir aos limites” incluindo defender posições como que a filosofia é uma ciência das ciências (ou uma Teoria garantidora das teorias científicas). Uma vez que tais posições tiveram o efeito de estimular a “luta teórica”, Althusser continuou a trabalhar e rearticular suas posições durante os anos 70. Em paralelo a isso, um número imenso de textos era produzido e guardado nos arquivos, muito provavelmente porque Althusser não os via como útil para suas intervenções teóricas dada a conjuntura. Talvez esse foi o destino do materialismo aleatório já existente desde os anos 60, mas que não eram aceitáveis dentro da conjuntura em que a luta era pelo marxismo e pelo materialismo dialético. A luta de Althusser era através de Marx e dentro do marxismo, e para intervir em tal conjuntura ele necessariamente deveria aceitar os conceitos e termos utilizados dentro dos partidos comunistas.

Mais do que um teórico combatente, Althusser era um filósofo cuja a prática materialista focava na “verdade efetiva da coisa” e queria intervir na conjuntura em que ele vivia, apesar de todas as coerções estruturais possíveis. Essa também foi sua solidão. Ser a favor de Althusser é entender como lutar e intervir dentro da conjuntura através de conhecimentos científicos, e sua utilização dentro da conjuntura. Analisar concretamente a situação concreta é entender a efetividade das determinações em um dado contexto e prever as reações. É lutar a luta de classes com uma posição a favor de todos os explorados e então da revolução. Althusser nos ensina que, apesar da coerção das formas sociais sempre internalizando diversas demandas e mantendo a reprodução social capitalista, mudanças são sempre possíveis. Elas podem se iniciar de encontros de práticas marginais, dar pega através de eventos externos, posteriormente aglutinar outras práticas e, com o as massas mobilizadas, fazer a revolução. A esperança emerge da desesperança generalizada do Realismo Capitalista: tudo que é sólido pode ser desmanchado, o capitalismo com todas suas formas exploratórias e excludentes pode ser superado, e daí o uma sociedade do companheirismo e do comum poderá dar pega e se reproduzir como uma estrutura dominante. O mundo então conhecerá o socialismo.


Notas

[1]Lewis, William, “Louis Althusser”, The Stanford Encyclopedia of Philosophy (Spring 2018 Edition), Edward N. Zalta (ed.), URL = <https://plato.stanford.edu/archives/spr2018/entries/althusser/>. Último acesso: 11 de janeiro de 2021.

[2] Althusser, Louis. For Marx. Vol. 2. Verso, 2005; Althusser, Louis. Reading capital: The complete edition. Verso Books, 2016; Althusser, Louis. “Ideology and ideological state apparatuses (notes towards an investigation).” Lenin and philosophy and other essays 127 (1971): 86.

[3] Mascaro, Alysson; Morfino, Vittorio, Althusser e o materialismo aleatório, Editora Contracorrente, 2020.

[4] Para entender o Althusser, penso ser mais pertinente a pergunta “qual a função desse texto dada a conjuntura política?” ao invés “o que Althusser quer dizer com esse texto?”

[5] Um trabalho extensivo foi recentemente publicado considerando a leitura completa dos trabalhos de Althusser. Ver: Sotiris, Panagiotis. A Philosophy for Communism: Rethinking Althusser. Brill, 2020.

[6] Althusser, L. (2010). Machiavelli and us. Verso.

[7] Althusser, Louis. “Philosophy as a revolutionary weapon: interview conducted by Maria Antonietta Macciocchi.” Lenin and Philosophy and Other Essays (2001): 11-22.

[8] Althusser, Louis. Philosophy and the Spontaneous Philosophy of the Scientists. Verso, 2012. D. Lecourt em sua leitura de Lenin oferece uma “aplicação” exemplar do pensamento althusseriano sobre as ciências. Ver: Lecourt, Dominique. Ensayo sobre la posición de Lenin en filosofía. Siglo Veintiuno. 1974, Mexico.

[9] Althusser, Louis. Philosophy for Non-philosophers. Bloomsbury Publishing, 2017.

[10] Novamente, Lecourt oferece uma proposta chamada “supermaterialismo” no cap. 4 do livro Lecourt, Dominique. El orden y los juegos: el positivismo lógico cuestionado. Ediciones de la Flor, 1984.

[11] Althusser, L. (2014). On the reproduction of capitalism: Ideology and ideological state apparatuses. Verso Trade.

[12] Nesse ponto, é importante analisar a leitura que Althusser faz dos autores modernos como Rousseau e Maquiavel, bem como Epicuro.

[13] Em L. Althusser (1971): Marxism-Leninism and the Class Struggle, há uma bom sumário do pensamento de Althusser em poucas páginas. Disponível em https://www.marxists.org/history/erol/periodicals/theoretical-review/tr-3-1.pdf

[14] Althusser, L. (1953). On Marxism. 1997), Louis Althusser: Early writings, Verso, London, 255. Principalmente p. 271-273.

[15] Há uma discussão sobre o conceito científico da Ditadura do Proletariado em que Althusser explicita essa posição. Disponível em https://www.lavrapalavra.com/2021/07/19/conferencia-sobre-a-ditadura-do-proletariado-em-barcelona/

[16] Thornton, Stephen, “Karl Popper”, The Stanford Encyclopedia of Philosophy (Spring 2021 Edition), Edward N. Zalta (ed.), forthcoming URL = <https://plato.stanford.edu/archives/spr2021/entries/popper/>.

[17] Lecourt, D.(1975). Marxism and Epistemology: Bachelard, Canguilhem, Foucault, New Left Review, Verso. O prefácio escrito aos leitores na versão em inglês apresenta uma crítica correta ao trabalho de Kuhn comparado às proposições de Bachelard.

[18] Kuhn, Thomas S. The structure of scientific revolutions. University of Chicago press, 2012.

[19] Althusser, Louis. Philosophy and the Spontaneous Philosophy of the Scientists. Verso, 2012.

[20] Althusser apresenta sua crítica em diversos textos desde seus primeiros escritos nos anos 50 até seus últimos textos dos anos 80. A análise mais completa encontra-se no Philosophy for Non-philosophers (Cap. 9 e 10). Ver também Dominique Lecourt: Marxism and Epistemology: Bachelard, Canguilhem, Foucault, e também A Filosofia das Ciências, Ed. Ideias e Letras, 2018.

[21] L. Althusser. (1986) “On History” in History and Imperialism: Writings, 1963-1986. Polity, 2020. Pages 156-157

[22] Prigogine, I., & Stengers, I. (2018). Order out of chaos: Man’s new dialogue with nature. Verso Books. Também, A Filosofia das Ciências  de D. Lecourt.

[23] Por exemplo, Gleiser, M. (2014). The island of knowledge: The limits of science and the search for meaning. Basic Books. Nesse livro, o físico brasileiro, mesmo seguindo uma visão mais espiritualista, mostra de maneira precisa como o conhecimento científico é histórico. O já citado Order out of chaos: Man’s new dialogue with nature também demonstra o caráter cultural das ciências uma vez que ela é parte do todo social. Os escritos de D. Lecourt, e os autores em geral afiliados à epistemologia histórica francesa, provam o caráter histórico na produção dos conceitos científicos.

[24] Seguindo os escritos do filósofo-físico Bachelard. Ver Marxism and Epistemology: Bachelard, Canguilhem, Foucault.

[25] Talvez esse seja o maior mal-entendido sobre o “materialismo aleatório” dos escritos de Althusser nos 80. É importante ressaltar que tal posição não-determinista é diferente do indeterminismo que nega a existência de determinações. Numa linguagem em voga nas “ciências da complexidade”, Althusser entende o aleatório como parte da dinâmica espaço-temporal de processos que podem emergir em dadas conjunturas devido a um efeito coletivo em que o “micro” como parte de uma estrutura dada com seus invariantes e suas determinações pode alterar qualitativamente o “macro”, que poder dar pega e se reproduzir (ou não) como uma nova estrutura. Se essa nova estruturação for bem sucedida se reproduzindo e se tornar dominante, novos invariantes e determinações têm a possibilidade de surgir (considerando os objetos em questão). Essa temática é bastante trabalhada hoje em dia na física de sistemas complexos probabilísticos e sistemas caóticos, incluindo conceitos como atratores e dependência das condições iniciais. Ver: Order out of chaos: Man’s new dialogue with nature. Também: Thurner, S., Hanel, R., & Klimek, P. (2018). Introduction to the theory of complex systems. Oxford University Press. Um bom resumo sobre o “materialismo aleatório” é apresentado no já citado: Althusser e o materialismo aleatório. Mais sobre o tema em https://lavrapalavra.com/2021/10/26/formas-sociais-e-materialismo-aleatorio/

[26] Talvez os trabalhos de David F. Noble sobre a formação das instituições de ensino nos Estados Unidos sejam o melhor exemplo disso. Ver: Noble, D. F. (1979). America by design: Science, technology, and the rise of corporate capitalism (No. 588). Oxford University Press, USA. David, F. N. (2017). Forces of production: A social history of industrial automation. Routledge.

[27] Lecourt, Dominique. “Proletarian science? The case of Lysenko.” (1977), Verso

[28] Mascaro, Alysson Leandro. Estado e forma política. Boitempo Editorial, 2015. É importante notar que tal derivação é factual e não lógica. Detalhe em Leandro Mascaro, Alysson. “Formas sociais, derivação e conformação.” Revista Debates 13.1 (2019).

[29] Ruuska, T. P. K. (2019). Reproduction revisited: Capitalism, higher education and ecological crisis. MayflyBooks.

[30] A. Mascaro (2021). Philosophy and Technology: A Perspective from Health Care and Law. Monthly Review Essays. https://mronline.org/2021/02/03/philosophy-and-technology-a-perspective-from-health-care-and-law/

[31] Althusser, Louis. Philosophy for Non-philosophers. Bloomsbury Publishing, 2017; Althusser, Louis. Philosophy and the Spontaneous Philosophy of the Scientists. Verso, 2012.

[32] Noble, D. F. (1979). America by design: Science, technology, and the rise of corporate capitalism (No. 588). Oxford University Press, USA.

[33] O capítulo sobre a indústria moderna e a mecanização da produção em O Capital de Marx é fundamental para se entender a dinâmica do processo de desenvolvimento tecnológico e científico.

[34] Prigogine em Order out of chaos: Man’s new dialogue with nature resume as origens da termodinâmica e sua relação com a física newtoniana dominante durante tal período.

[35] Cooke, Roger Lee. “Andrey Nikolayevich Kolmogorov”. Encyclopedia Britannica, 16 Oct. 2020, https://www.britannica.com/biography/Andrey-Nikolayevich-Kolmogorov. Accessed 25 February 2021; Markowsky, George. “Claude Shannon”. Encyclopedia Britannica, 20 Feb. 2021, https://www.britannica.com/biography/Claude-Shannon. Accessed 25 February 2021. Copeland, B.J.. “Alan Turing”. Encyclopedia Britannica, 19 Jun. 2020, https://www.britannica.com/biography/Alan-Turing. Accessed 25 February 2021. Gerovitch, Slava. From newspeak to cyberspeak: a history of Soviet cybernetics. MIT Press, 2004. Este último livro propõe uma leitura histórica sobre como a cibernética emergiu após a segunda Guerra na União Soviética e nos Estados Unidos.

[36] Os documentários de Adam Curtis demonstram muito bem tal relação. Em especial, Padora’s box (1992), The century of the self (2002), The trap (2007), All watched over by machines of loving grace (2011),  Hypernormalisation (2016) e Can’t get you out of my head (2021). Os documentários estão disponíveis em https://thoughtmaybe.com/by/adam-curtis/.

[37] Srnicek, Nick. Platform capitalism. John Wiley & Sons, 2017.

[38] Fisher, M. (2009). Capitalist realism: Is there no alternative? John Hunt Publishing.

[39] Naves, M. B., Marx – ciência e revolução. 1ª. ed. São Paulo/Campinas: Moderna/ Editora da Unicamp, 2000.

[40] Althuser,L. History and Imperialism: Writings, 1963-1986. Polity, 2020, p.37-39.

[41] Althusser, Louis. Machiavelli and us. Verso, 1999.

[42] Althusser, Louis. Lessons on Rousseau. Verso Books, 2019.

[43] Simondon, Gilbert. On the mode of existence of technical objects. Minneapolis: Univocal Publishing, 2017.

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